Por Ricardo Bohn Gonçalves
Na semana passada, contei aqui do meu caso de amor com os vinhos da Borgonha. E contei que em breve farei a minha oitava visita à região. Só faltou dividir com vocês o que eu gosto de fazer na Borgonha.
Para mim, passear pela Borgonha é respirar vinho, nas mais diversas formas. Dou um exemplo: o prédio mais famoso de Beaune, a principal cidade local, é o Hospice de Beaune, uma antiga Santa Casa de Misericórdia, fundada em 1443 e hoje um museu. Visitá-lo é parada obrigatória a começar pelos seus telhados de vidro coloridos, em um desenho único. O museu traz tanto a história da Santa Casa, um projeto social implementado pelo casal Nicolas Rolin e Guigone de Salins, ainda no século 15, e também dos seus vinhos, que vieram logo a seguir.
Explico melhor: desde o início de seu funcionamento, o hospital vem recebendo vinhedos como doação (é até recente, cerca de dez anos atrás, as últimas doações de vinhedos para o Hospice). Seus administradores encontram no vinho a forma de financiar o cuidado com a saúde. Atualmente são aproximadamente 60 hectares de pinot noir e de chardonnay, espalhados pela Borgonha, que são cuidados pela equipe de enologia do Hospice. A simpática Ludivine Griveau é a enóloga responsável pelos vinhedos (e ela tem uma forte preocupação pela agricultura orgânica) e pelo vinho, até o momento em que esses brancos e tintos são colocados em barricas.
Ludivine Griveau - Hospices de Beaune
Em um sistema único e que funciona muito bem, o vinho é vendido quando a fermentação acaba e ele é vai para as barricas de carvalho. Mas não é uma simples venda. No terceiro domingo de novembro, estas barricas são leiloadas e cabe ao comprador cuidar do seu amadurecimento, ou élevage, como os franceses definem este processo de afinamento da bebida. O dinheiro arrecadado pelo leilão financia a instituição. No ano passado, por exemplo, foram arrecadados € 23,279,800, o segundo maior valor desde que o leilão foi criado em 1795.
Nunca fui a esse leilão, que sei que movimenta a cidade, e atualmente é administrado pela Sotheby’s. Mas sempre que passo em Beaune visito o museu e aproveito para ver – e às vezes, comprar – brancos e tintos na loja Marché aux Vins (Rue de l’Hotel Dieu, 7), que fica bem pertinho de lá. Dou preferência a produtores que não estão no mercado brasileiro.
Gosto de me perder pelas pequenas ruas da cidade, de visitar a sua catedral, a Notre Dame de Beaune, que tem um estilo menos imponente do que as demais Notre Dames francesas. Entro e aproveito para meditar por 10 minutos, respeitando a crença de cada um.
Beaune tem grandes restaurantes estrelados, com suas receitas que tão bem harmonizam com os vinhos locais. O boeuf bourguignon é um clássico, sempre. Mas tem também pequenos achados, que permitem almoçar e jantar com a companhia dos vinhos locais. Gosto muito do Ma Cuisine, que também fica na parte histórica da cidade (Passage Ste Hélène). O endereço é um misto de wine bar com restaurante, com mais de 20 mil garrafas para quem quer entrar na cultura da Borgonha.
Restaurante Ma Cuisine
Os vinhedos são a segunda (ou devo dizer, primeira) parada obrigatória pela Borgonha. Alugar um carro e passear pela pequena rodovia que margeia suas vinhas, reconhecendo os seus nomes, é um passeio delicioso. A Cote d’Or não tem esse nome à toa. Na primeira visita, vale parar em frente ao vinhedo da Romanée Conti e tirar uma foto ao lado de sua conhecida cruz. A Borgonha, confesso, não tem a paisagem mais bonita entre os destinos do enoturismo, mas a rota pelos vinhedos grand cru tira o fôlego de qualquer um. Gosto também de visitar os seus pequenos vilarejos, Gevrey, Pommard, Chassagne, entre outros.
Mais que isso: estar na Borgonha é respirar a tranquilidade dos vignerons. Lá, tudo parece caminhar devagar, muito ao contrário de sua “rival’ Bordeaux. Há tempo para desfrutar os vinhos e a gastronomia, para observar os vinhedos e para colocar a leitura em dia. Só lamento não ser muito fácil visitar as vinícolas. Há as grandes, claro, mais comerciais e com estrutura para o turista. Mas são raros os pequenos produtores que recebem os turistas, simplesmente porque eles não têm a estrutura para atender os visitantes. A mão de obra é escassa, normalmente é a própria família que cuida do negócio, e a escolha é sempre pelo vinho.
A minha dica de ouro é alugar uma casa na região. Fiz isso na minha última viagem, a sétima. Ficar em casa e ter de providenciar o menu é descobrir uma outra Borgonha, a do mercado, da feira de rua, do fornecedor de pato, de mel e, claro, dos vinhos.
Excelentes dicas
ResponderExcluirObrigada!
ExcluirOi Ricardo, obrigado pelas dicas.
ResponderExcluirO sistema de leilão apresentado fez-me lembrar sobre uma feira de vinhos “vignerons independants” de Bourdeaux onde o produtor “Chateau Perayne” me ofertou 24 garrafas para retira-las em 24 meses. E, há época, ele garantia um preço futuro em caso de revenda. Sensacional!!
Que legal!!!
ExcluirAdorei seu artigo da Bourgogne, amigo.
ResponderExcluirObrigada Orlando!
ExcluirBom dia Ricardo , artigo tão elegante , suave e agradável como os PN da Borgonha ; poderia ter sido mais longo !rs .Ja fui 2 x pra lá , tenho tudo pra aprender com seus conhecimentos.
ResponderExcluirObrigada :-)
ExcluirRicardo , pode usar meu nome pra identificar o comentário:Prado Neto
ResponderExcluirMe deu muita saudade da Borgonha e de seus vinhos!
ResponderExcluirRicardo adorei o texto! Pena que os vinhos de Hospice de Beaune são tão raros de se ver por aqui, na verdade só os vi à venda uma única vez, fazer o que né! Para prová-los só indo para lá mesmo.
ResponderExcluirEsse lugar é muito bonito de fato.
ResponderExcluirJá fui a este restaurante. Excelente carta de vinhos. Joao
ResponderExcluirRicardo, parabéns pelo blog. Está muito saboroso ler seus comentários. Abraços.
ResponderExcluirque bom que gosta, obrigada!
ExcluirMuito bom texto, parabéns. Temos planos de fazer o que você fez, alugar um local e fazer cursos por lá. Mas senti falta de de algumas palavras sobre Chablis... abraços.
ResponderExcluirAnotado para proximo post: CHablis!
ExcluirNão sou anônimo, sou o Rodrigo Britto...
ResponderExcluir:-)
ExcluirRicardo muito boas dicas para próxima visita a Borgonha.
ResponderExcluirBoas dicas e muito objetivas. Belo post!
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