A Mesa do Bohn

Por Ricardo Bohn Gonçalves

Não sei precisar se foi em algum filme que assisti, se foi uma cena de um livro ou se foi quando soube que o Winston Churchill, então primeiro-ministro inglês, tinha uma mesa fixa no seu restaurante preferido. E onde, claro, tinha sempre uma garrafa do champanhe Pol Roger esperando por ele. O fato é que há tempos eu tenho a fantasia de ter uma mesa cativa para mim em um restaurante, como uma reserva garantida, um espaço em que encontro os meus amigos, que as pessoas sabem que podem me encontrar por lá.

Hoje, aliás, uns dois anos antes da pandemia do coronavírus que a “Mesa do Bohn” é uma realidade. Mas de um modelo um pouco diferente do que eu imaginava e, posso, confessar, de um jeito que eu gosto muito. Começou meio por acaso, quando fui almoçar com o Lamberto Percussi, ainda na sede antiga da Vinheria, na rua Conego Eugenio de Lima, em Pinheiros, São Paulo. Sócio com a irmã Silvia na Vinheria Percussi, o Lamberto é um dos grandes amigos que o mundo do vinho me trouxe. Já tomamos juntos muitos vinhos inesquecíveis, de grandes produtores e safras, e também algumas garrafas que a gente gostaria de esquecer...

Temos vários amigos em comum. Numa sexta-feira do ano de 2017, fui almoçar com o Lamberto e mais dois amigos e surgiu a ideia de repetir o encontro na sexta-feira seguinte. No próximo encontro, decidimos voltar a conversar na outra sexta-feira. Sentávamos na mesma mesa e o grupo de amigos era mais ou menos o mesmo, e assim foi surgindo a “Mesa do Bohn”.

Paramos quando veio a pandemia e logo voltamos quando o restaurante reabriu e quando, realmente, precisávamos muito destes encontros. Depois, a Vinheria mudou para a rua Bianchi Bertoldi, ainda em Pinheiros, mas bem mais perto da avenida Faria Lima, e mantivemos a tradição. E a nossa mesa se tornou uma redonda, em um dos cantos do restante, antes do “aquário”, que é a área reservada para eventos na casa.

Nossa organização é simples: trocamos mensagens na véspera, confirmando quem irá ao almoço. Não é uma presença obrigatória e tem sexta-feira que eu mesmo não consigo ir, mas o grupo de reúne. Cada um leva um vinho. Na hora, definimos a ordem dos vinhos e o Lamberto sugere os pratos, a partir das garrafas que escolhemos. Não é uma harmonização técnica, mas receitas que devem combinar com os vinhos. Atualmente, estamos em dez pessoas, em um almoço de sexta-feira que raramente termina antes das 17 horas. A maioria dos presentes é do sexo masculino, mas muitas amigas aparecem também.

O interessante é que a minha ideia de mesa era para um petit comité, de conversas mais privadas. Mas o modelo que vingou é de encontros maiores, mas sempre muito gostosos. E quando o assunto é mais privado, eu marco em outro dia da semana, mesmo que muitas vezes seja na própria Vinheria.

Mas por que estou trazendo esta história aqui? Porque a partir de uma ideia meio fantasiosa de ter a minha mesa, eu acabei criando um espaço que se tornou muito importante para mim. Adoro São Paulo, adoro vinho e adoro os meus amigos. Mas São Paulo é uma cidade que nos engole, que nos deixa com pouco tempo para as pessoas que gostamos, para as boas conversas. A “Mesa do Bohn” é um pretexto para encontrar os amigos. E deixo aqui a minha pergunta para vocês: quais são os seus pretextos, as suas desculpas (se é que precisamos dela) para encontrar os amigos?