Dê uma – ou muitas – chances ao Beaujolais

RBG Vinhos
Por Ricardo Bohn Gonçalves

Os vinhos da região de Beaujolais, ao ladinho da Borgonha, são um exemplo de como o marketing pode prejudicar uma região e, infelizmente, não são o único – a história dos vinhos alemães da garrafa azul são outro bom exemplo, que qualquer dia conto por aqui. As duas histórias, aliás, também são um exemplo de como os produtores souberam dar a volta por cima e, por isso, vale (muito) falar e provar os beaujolais e os vinhos alemães atuais.

No caso do Beaujolais, o erro foi a campanha de incentivo ao beaujolais nouveaulançada algumas décadas atrás. No início, assim como nas garrafas alemães, a campanha parecia genial e foi, realmente, um sucesso. Todo mundo (eu inclusive) queria provar o beaujolais nouveau daquele ano. O vinho chegava ao mercado logo depois da colheita, sempre na terceira quinta-feira de novembro, e não faltavam degustações e festas para brindar a sua chegada.

Para que fosse possível ter o vinho pronto neste curto período de tempo (a mudança climática ainda não adiantava tanto a maturação das uvas e elas eram colhidas entre meados de agosto e setembro), o caminho era elaborá-lo com a técnica de maceração carbônica, em tanques fechados. O resultado era um tinto ainda mais leve do que o beaujolais tradicional, muito frutado – com uma inconfundível nota de banana – e festivo. Claro que uma festa acompanhava o seu lançamento. E uma grande estratégia de logística era montada para que o vinho estivesse em todos os mercados, Brasil inclusive, no dia do lançamento. Por aqui, significa enviar as garrafas por avião, pagando fretes bem altos, para importar um vinho simples, para consumo imediato.

Não demorou muito para os vinhos de toda a região de Beaujolais perderem prestígio. O nouveau não envelhecia bem na garrafa, não tinha complexidade, era caro para o que entregava. E isso acabou manchando a fama de toda a região, principalmente dos demais beaujolais, mesmo os mais simples, classificados apenas como beaujolais ou como village, que continuavam simples, leves, fáceis de beber, mas com a qualidade correspondente ao seu preço. Não é à toa que os beaujolais são aqueles tintos dos bistrôs franceses, descompromissados como o ambiente pede.

Mas, ainda bem que os produtores, mesmo com a má fama do nouveau, não desistiram dos seus vinhos, principalmente os pequenos viticultores. Com o avanço das técnicas de vinificação e de manejo dos vinhedos, a qualidade do vinho melhorou, fenômeno que, aliás, aconteceu em várias regiões produtoras.

E não foi apenas nos village que isso aconteceu. A região tem dez crus, como Morgon, Fleurie, Saint-Amour, que também plantam apenas a gamay entre as variedades tintas e focam em vinhos de qualidade. E, aqui, não colocam a palavra beaujolais em destaque, mas sim o nome do cru correspondente no rótulo. Não raro, há exemplares que se igualam em qualidade aos vinhos da Borgonha. São ótimos vinhos, mais complexos, estruturados. Já li até estudos que, devido às mudanças climáticas, a gamay pode substituir a pinot noir em alguns terroirs da Borgonha.

Minha dica é ficar atento a estes produtores dos cru de Beaujolais. Aqui na RBG trabalhamos com dois produtores, o Julien Sunier e a Mee Godard. Recomendo não apenas os seus tintos, mas também os brancos. Sim, há na região de Beaujolais produtores que elaboram bons brancos, com a complexidade dos grandes Borgonhas, e sempre com a uva Chardonnay.


Comentários

  1. Marcos Cavaloti23/3/25

    Ricardo ...valeu pela matéria!!Abraços
    Marcos Cavaloti

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  2. Anônimo23/3/25

    Ricardo JM e eu adoramos rever as historia do Beaujolais nouveau!!! Um vez (aprox 1998) eu estava em Paris nessa época, mas meu gosto não era tão apurado…..

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  3. Anônimo24/3/25

    Muito interessante essa análise sobre o Beaujolais, É curioso como o sucesso inicial do nouveau acabou prejudicando a reputação da região como um todo. Bom saber que os produtores souberam dar a volta por cima e que os crus estão ganhando destaque novamente. fiquei curioso para provar os vinhos de Julien Sunier e Mee Godard — parece que vale a pena explorar além do nouveau!

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  4. Anônimo24/3/25

    Esclarecedor

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