Talhas e ânforas

RBG Vinhos

Por Ricardo Bohn Gonçalves

O vinho “Constança vai à vinha...nas talhas logo chama atenção pelo seu nome, no mínimo, bem-humorado. Rótulo especial da Herdade dos Outeiros Altos, esse tinto é também a nossa homenagem a essa maneira de elaborar vinhos no Alentejo e que vem me surpreendendo nos últimos anos.

Confesso que cheguei às talhas, como estes potes de terracota são chamados em Portugal, por curiosidade. Elas começaram a reaparecer nos últimos cinco, no máximo dez anos, para quem acompanha o mundo do vinho. Antes disso, estes vinhos eram para mim (e acho que para muita gente) uma maneira de resgatar uma cultura tradicional do alentejano. Um conhecimento que passa de pai para filho há gerações, de colher as uvas bem maduras, colocá-las nas ânforas junto com os seus engaços e esperar até o dia de São Martino, em 11 de novembro, para abrir a talha.

Lembro de uma visita que fiz pela região e que me ofereceram este vinho em um copo. Provei com a curiosidade de um turista que quer se surpreender com o local. Nada mais do que isso.

Mas hoje a minha opinião mudou sobre estes vinhos. Fico feliz que a cultura ainda se mantém nos vilarejos alentejanos. Mas agora, junto com estes vinhos mais simples, há enólogos que trabalham para fazer brancos e tintos de talha de maior qualidade. É a união do conhecimento enológico contemporâneo com a tradição, e cada um respeitando e valorizando a contribuição do outro.

O melhor exemplo é o evento Amphora Wine Day, que acontece sempre no final de semana depois de 11 de novembro, na Vidigueira, uma das regiões do Alentejo.Organizado pelo casal de enólogos Catarina Vieira e Pedro Ribeiro, da Herdade do Rocim, a proposta é reunir produtores de vinho em talha dos mais diversos países. Nesta edição, quase 50 vinícolas participaram do encontro, que recebeu, inacreditavelmente, 1.800 pessoas.

Nas talhas, não apenas vinhos de Portugal, mas também de países como Georgia (onde tudo começou), Itália, França, Espanha e até do Chile, além, claro, de muitos portugueses. Um evento importante para resgatar uma história e uma cultura milenar, mas para mostrar que esta cultura não precisa ficar parada no tempo.

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